Internet, cadê a revolução?

A palavra gasta lança uma névoa sobre a Internet latente

Cada revolução foi antes um pensamento na mente de um homem – Ralph Waldo Emerson

A Internet é frequentemente chamada de revolucionária, assim como a nova marca de sabão em pó, o novo modelo de automóvel e o novo absorvente íntimo; todos são talhados a mudar a sua vida e existe demanda para isso.

Na análise dos números de uso da Internet, é fácil ver suas curvas de crescimento, o aumento de sua penetração e de horas em frente ao computador, mas popularização não é suficiente para tornar algo revolucionário. Avaliando-se os hábitos de navegação, percebe-se que cada internauta navega por um grupo pequeno de websites diariamente e cada vez mais tempo.

Talvez o hábito seja herdado do enraizado consumo televisivo, assemelha-se a ele; mesmo com o zapping, orbitamos entre poucos canais, notadamente os velhos canais abertos. Por reflexo, carregamos o hábito para a nova mídia, o que resulta na grande audiência dos maiores portais, muitas vezes versões compactas de um jornal impresso ou canal de televisão. Não raro esses grandes websites recebem papel subalterno, de promoção, suporte e complementação; remetem ao impresso, ao programa de TV.”A característica diferencial da Internet não está no hyperlink, que pode ser comparado ao zapping da tevê”

A característica diferencial da Internet não está no hyperlink, que pode ser comparado ao zapping da tevê; não está no modo de leitura recortado, que pode ser comparado à pirâmide de informação de um jornal; não está no caráter instantâneo da informação, a TV com sua hegemonia e com os satélites varando a Terra ainda é o meio preferencial para a disseminação rápida dos acontecimentos pelo mundo afora; não está na multimídia, a anterior popularização dos computadores pessoais já trouxera essa prerrogativa. A convergência prevista para a rede também não será protagonista da transformação. Mas é inegável que a nova mídia tem caráter revolucionário. E a revolução mora na produção.

Nenhum outro meio de comunicação facilita de tal maneira a produção e veiculação de conteúdo original como a Internet, colocando potencialmente em pé de igualdade desde uma grande empresa de comunicações até o indivíduo, antes mero consumidor final. Do ponto de vista técnico há a ausência da necessidade de técnica. É mais fácil colocar no ar um website que explore todas as possibilidades do meio do que mimeografar um pasquim (mesmo com a saudade do cheiro de álcool). No ponto de vista da publicidade, da audiência, vem à cena um fator que também deriva do novo modo de produção, o elemento comunitário. Há uma relação de “muitos para muitos” no feitio e na distribuição de conteúdo, no lugar de uma relação anterior de “um para muitos”. É assim que, por um lado, não existem restrições de pauta considerando a totalidade da rede, e toda mensagem é a quem interessar possa. A grande rede então vive seu destino ao limite, ao possibilitar a geração de sub-redes, comunidades não necessariamente regradas por territórios físicos, mas por sintonias políticas e ideológicas.

O movimento será mais lento do que se pode esperar de uma “revolução” e pode mesmo passar desapercebido pelo tempo afora. Enquanto milhares de pessoas só aguardam a propalada inclusão digital, outros tantos aguardam a inclusão na renda mínima, sob o auspício de um Estado qualquer. Enquanto tantos começam a produzir para a web, ainda não necessariamente publicando, mas exercendo escolha e formando suas redes pessoais, outros ainda navegam de maneira inercial nos conteúdos que cheiram a tradição.